Tuesday 1 October 2013

KARESANSUI

     RYOAN-JI

 

      Karesansui é nome que se dá aos famosos jardins de pedra japoneses, apelidados contemporaneamente como “Jardim Zen”. Esses jardins já existem há mais de mil anos e estão extremamente atrelados à história e cultura do país. Cada elemento no jardim simboliza algo e a forma com que são dispostos dá um significado ao contexto. A parte mais importante no “projeto” do jardim é a seleção e disposição das rochas. Sakuteiki é o nome de um livro escrito nessa época que funciona quase como um manual de como montar um karesansui, nele o autor descreve exatamente como as rochas devem ser dispostas para dar o significado pretendido. Para representar uma montanha, por exemplo, deve-se escolher uma rocha vulcânica, com formato vertical. Raramente uma única rocha chama atenção para si, o que se valoriza é a composição harmônica. No Sakuteiki o autor instrui: “Certifique-se de que as rochas sejam dispostas de forma a mostrar sua melhor face. Se uma pedra tem seu topo feio deve-se colocá-la de forma a dar proeminência ao seu lado mais bonito, muitas vezes isso significa incliná-la até que não se note a face indesejada. Sempre deve haver mais pedras horizontais do que verticais.” Existem diversas combinações que podem ser feitas, porém as pedras nunca devem ter uma relação de simetria nem padrão. A areia branca e o cascalho são herança da religião Shinto, na qual simbolizam pureza, eram espalhados ao redor de templos e palácios. Nos jardins karesansui representam a água, ou como o branco nas pinturas japonesas representa o vazio e a distância. A ação de varrer o jardim desenhando na areia tem a intenção de mimetizar o movimento da água, e é praticada todos os dias pelos monges, ajudando a treinar a concentração. É mais comum de se encontrar cascalho do que areia, por ser mais resistente a chuva e ao vento.

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      O período Muromachi (1336-1573), que coincide com o Renascimento na Europa, foi caracterizado no Japão por rivalidades políticas frequentemente desencadeando guerras, mas também ficou marcado por um extraordinário florescimento da cultura no país. Nesse período se observa o início das famosas cerimônias de chá, do teatro Noh, do estilo arquitetônico shoin e dos jardins de pedras. O budismo zen só foi introduzido no Japão no fim do século e foi rapidamente adotado, especialmente pela classe dos Samurais e lordes de guerra, que admiravam a doutrina auto-disciplinar trazida pela religião. Os jardins dos primeiros templos zen remetiam aos jardins chineses, as primeiras composições eram quase uma cópia, onde rochas agrupadas simbolizavam o Monte Penglai, a ilha-montanha gigante, lar dos oito imortais na mitologia chinesa, também conhecida na cultura nipônica como Horai. Entre os séculos XIV e XV um novo estilo de jardins começou a aparecer nos mais importantes templos zen em Kyoto. Esses novos jardins eram projetados para estimular a meditação, de alguma forma imitando a natureza. Bem, não exatamente a natureza no que se refere à sua aparência, mas à sua essência, seu poder de instigar a meditação sobre o sentido da vida. Michel Baridon escreveu: “Natureza, se o tivesse feito expressivo reduzir à formas abstratas, poderia transmitir os mais profundos pensamentos através da  simples presença”.

TENYU-JI

      O primeiro jardim considerado pelos estudiosos a marcar essa transição é o Saihō-ji, “O templo dos perfumes do Oeste”, popularmente conhecido como Koke-dera, o templo do musgo, criado pelo um monge budista e mestre Musō Kokushi transformou um templo budista em um monastério zen. O jardim mais baixo de Saihō-ji segue a tradição do período Heian, um lago com composições de rochas representando ilhas. O jardim superior é composto por três “ilhas” de pedra. A primeira, Kameshima, a ilha da tartaruga, remete uma tartaruga nadando em um lago de musgo. A segunda, Zazen-seki, é uma pedra meditativa achatada e se acredita que irradie calma e silêncio. A terceira é a Kare-taki, uma cacheira seca composta degraus de granito, o musgo que a rodeia representa a água e não fazia parte da pedra originalmente. Musō Kokushi também construiu outro jardim. No templo de Tenryū-ji, o templo do dragão celestial. Esse jardim parece ter sido fortemente influenciado pelas pinturas chinesas da dinastia Song, compostas por montanhas surgindo em meio a névoa, sugerindo altura e profundidade. O jardim de tem um lago, com água, e uma cacheira seca de rochas se assemelhando muito com paisagens chinesas. Ambos os jardins de Tenryū-ji e Saihō-ji ilustram a transição do estilo Heian para um novo estilo que representa a natureza de forma mais abstrata.

Templo do Musgo.

      O mais famoso dos jardins em Kyoto é o Ryōan-ji, construído no final do século XV, quando os jardins se tornam puramente abstratos, tendo seu formato retangular e ocupando uma área de 340m². São dispostas 15 pedras, cuidadosamente compondo cinco grupos, rodeados por cascalho branco, revolvidos todos os dias pelos monges. A única vegetação no jardim é um pouco de musgo em volta das pedras.

O desenvolvimento desse novo estilo de jardins estava diretamente ligado com as pinturas japonesas de paisagens, alguns artistas, como Sesshū Tōyō e Soami, simplificavam suas visões da natureza mostrando apenas os aspectos considerados mais essenciais, deixando em branco o entorno de desenhos pretos e cinzas. Michel Baridon acredita que os jardins do período Muromachi nos mostram que o Japão havia levado a arte de se fazer jardins ao mais alto nível de refinamento intelectual possível de se atingir.

 

Texto por: Ana Maria Magalhães

 

Fontes:

http://www.tenryuji.com/

http://www.ryoanji.jp/smph/eng/